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quarta-feira, 26 de abril de 2017

DA SÉRIE: HISTORINHAS DO BIFÃO...

Descanse em Paz...

            O Rio de Janeiro anda tão perigoso que nem os mortos estão tendo mais o direito de descansar em paz. Tanto assim, que muitos cemitérios trancam as capelas durante a madrugada, só reabrindo na parte da manhã. Os bandidos sabem que o morto está “duro”, mas os vivos sempre têm alguma coisa para perder.
            O Valter cumpriu a sua tarefa no globo terrestre e foi ao inevitável encontro com o criador. Assim que a capela abriu pela manhã, começaram a chegar os parentes. Pedrinho, um garoto muito curioso correu logo para perto caixão. Só ele e o defunto estavam na capela. O garoto teve certo receio de ver quem estava dentro do paletó de madeira.
_ O que você quer Pedrinho?
         O moleque quase enfartou, pois não reconheceu a voz do pai e achou que era o morto que havia feito a pergunta.
_ Pô, pai. Isso é coisa que se faça? _ ele se virou para o genitor _ Quase que a gente tem de voltar para casa para eu trocar as calças.
         E começaram a chegar os parentes. Já repararam que o sujeito quando morre, se a Igreja Católica permitisse, seria canonizado ali mesmo, antes do enterro...
_ Ele era tão bom.
         Era a frase mais repetida nas rodinhas. Um parente do Valter que era chegado a beber no mesmo copo do Lula, se aproximou do caixão. Ficou algum tempo e depois sai da capela. Na entrada cruzou com um primo que havia acabado de chegar.
_ Como está? _ perguntou o recém-chegado.
_ Morto! _ respondeu o parente bêbado, pensando que a pergunta se referia ao defunto.
         Se o morto na ressuscitou com o bafo daquele parente, nada mais o faria levantar.
         Valter havia deixado três viúvas. A primeira, que casou quando ele era um “João Ninguém”. A segunda, que viveu com ele quando a maré estava melhor e era só um “João”. E a última, muito mais nova, que pegou no momento da vida em que ele tinha “nome e sobrenome”. Se detestavam, mas se aturavam naquele momento de despedida...
_ Não pode ser verdade que ele morreu. _ dizia a viúva com mais idade.
         No que o bêbado se aproximou dela.
_ Se não for verdade, acho uma sacanagem, pois gastaram uma grana nesse velório e ainda vão enterrar o cara daqui a pouco...
         As três recebiam atenção pela perda, mas, a mais nova, era a mais consolada pelos homens, doidos para experimentar o espaço vazio na cama dela, antes mesmo dele esfriar...
_ Deve ter morrido de tanto usar Viagra com essa daí. _ dizia a viúva do meio. Aquela com menos atributos físicos das três.
         Enquanto isso, lá estava o Valter. Alinhado como sempre viveu. Vestindo um terno caríssimo que a vida lhe proporcionou. Se não estivesse morto, poderia sair dali e ir direto para uma reunião em Brasília, que está cheia de gente que já morreu e não sabe...
         Recuperado do susto, Pedrinho se aproximou do pai e perguntou.
_ Pai, por que a gente morre?
_ Filho... _ o pai escolhia as palavras para não espantar a criança. _ A vida é um ônibus. Quando a gente desce desse, embarca no outro, que é o da morte. E a parada desse segundo ônibus é o céu.
_ Pois eu quero ficar nesse ônibus daqui. _ disse o bêbado. _ A passagem é muito cara e eu quero aproveitar muito a viagem.

         E lá se foi o Valter para o “vai e vem da estação”. Enquanto uns chegam outros partem. E ele aproveitou bastante a sua estada pelo “Lindo Balão Azul”. Se não foi a alma mais pura que existiu no Brasil (privilégio do Lula), pelo menos, durante o velório, foi elevado à condição de “São Valter”...

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