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segunda-feira, 27 de abril de 2015

DA SÉRIE: HISTORINHAS DO BIFÃO...



Almoço de domingo em família.

Nada mais tradicional que, no domingo, você assistir futebol ou Silvio Santos. Ledo engano. Esqueceu-se do almoço de domingo? Aquele para o qual a família toda é convidada? E algumas famílias extrapolam. São gigantescas. É tanta gente que você fica cansado de cumprimentar na chegada e na despedida, ao final do dia. É tanto oi e tchau que você quase tem um deslocamento de maxilar de tantos beijos. A mão fica dormente de tanto aperto.
         Sem falar no cunhado folgado (toda família tem um). Aquele que já chega como dono da situação. Apodera-se do controle remoto. Todo mundo só vê na TV o que ele quer. Deita-se no sofá sem cerimônia e deixa pelo menos três pessoas sem lugar para sentar. Além de “liberar flatos” a todo instante, sempre querendo colocar a culpa em alguém menos avisado. É o “engraçadão” da reunião.
         Era o primeiro almoço de domingo dele na casa da namorada. Estava mais deslocado que centroavante que é levado para a ponta. Mais retraído que time pequeno que joga contra o Barcelona. Olhava para o chão como um avestruz que busca a chance de enfiar a cabeça em um buraco e se enterrar.
         Por mais que a namorada tentasse fazer com que ele se soltasse, ia para a defensiva. Logo ele, que é descolado. Mas alguma coisa o intimidava ali. Era o centro das atenções, mesmo contra a vontade. Achava que a qualquer momento seria entregue ao disque-denúncia ou qualquer coisa do tipo.
         Até o cachorro havia cismado com ele. Já tentara atacá-lo duas vezes. Lembra-se do cunhado folgado? Sim, ele fez uma piada:
_ Não morde não. É só não deixar fechar a boca.
         E a namorada dele seguia apresentando o jovem a cada parente presente à reunião familiar. Era tanta gente que se sentia um político em campanha eleitoral.
_ Cuida da minha prima, caso contrário, a família cuida de você com carinho. _ Disse um primo da jovem.
Essa brincadeira soou como uma “ameaça siciliana”. Ele olhava para o cidadão na dúvida se sorria ou se descia a mão nele para deixar de ser besta.
         E bateu a vontade de beijar a namorada. Mas como? Os pais os vigiavam igual a um americano aos suspeitos de terrorismo. Não que eles fossem contra os beijos do casal, mas é que fica um clima estranho. No sofá não podia. Sobre ele havia o cunhado folgadão totalmente largado naquele espaço da casa.
         Na hora do almoço, cheio de receio, ele comia menos que gordo que fez redução de estômago, cheio de não me toques. Estava, mais uma vez, se sentindo o centro das atenções. Parecia que todo mundo estava olhando como ele segurava os talheres, contava quantas mastigadas ele dava. Como pegava o copo para beber o suco.  Queria que a comida acabasse logo. Até a avó da garota não tirava os olhos dele. Se fosse “décadas mais nova” acharia que estava dando mole. Mas o cunhado folgadão, aquele corno, não podia deixar passar em branco a oportunidade de constrangê-lo mais ainda.
_ Que tal dar um beijo na prima com a boca cheia de farofa? A língua dela vai parecer que está à milanesa...
         O pior é que todo mundo achou graça. Até a namorada. Desejou do fundo da alma que aquele miserável tivesse uma congestão. Que caísse na mesa “já fedendo”. Chegou a visualizar a cena, mas foi chamado à realidade pela sogra:
_ Quer mais um pouco?
_ Não. _ pensou. _ A única coisa que eu quero é levantar daqui o mais rápido possível.
         Ele negou com um leve balançar de cabeça. Deu um sorriso amarelo para a sogra e, com a voz mais presa que petista envolvido no escândalo da Petrobras, falou:
_ Estou satisfeito. Obrigado.
         E o dia transcorria tranquilo para as pessoas da casa. Para ele parecia que as horas não passavam. Olhava para o relógio da parede, para o de pulso, mas os dois pareciam que se arrastavam. Teve a impressão de que o de parede chegou a fazer careta para ele. Apesar de estar ali há várias horas, ainda se sentia deslocado.
_ Minha família parece um exército. Quando se reúne é assim mesmo. _ Falou a namorada agarrada ao braço dele.
         Nem precisava falar. Ele já havia reparado. Em cada canto da casa havia um grupo. Se todos ficassem juntos no mesmo lugar, haveria mais gente que em muito jogo do Campeonato Carioca.
         As crianças corriam para lá e pra cá. Um molequinho com bota ortopédica fazia questão de escolher o pé dele para pisar e a canela dele para chutar.
         Finalmente o domingo chegou ao seu fim. A noite avançava e a família diminuía a presença. Um após outro iam se despedindo. Voltou à rotina de beijos e apertos de mão. Era chamado de “fofinho” pelas tias mais velhas da menina. A vovó lhe deu aquele beijo que só os idosos sabem dar: “molhado”.
         O cunhado foi um dos últimos a deixar a casa. Para fazer valer o “título de folgadão”, as únicas vezes que se levantou do sofá foram para comer e ir embora (Esqueci. Algumas vezes para ir ao banheiro).
         Ficou por último. Despediu-se dos pais da garota. Foi com ela até o portão e recebeu a notícia:
_ Daqui a 15 dias tem o aniversário da vovó. A família vai se reunir de novo. Todos gostaram de você.
_ Todos uma ova. _ falou consigo mesmo_ O cachorro, o moleque do chute na canela e o cunhado mala não estão incluídos nesses “todos”.
         Sorriu, a beijou e foi embora. No caminho ficou pensando que dentro de duas semanas estaria vivendo tudo de novo. Pelo menos havia o consolo de que não seria mais novidade. Talvez não fosse tão observado. Até a vovó não “daria tão mole” para ele.
         De qualquer forma tinha alguns dias para pensar como se vingar do cunhado mala que tanto o perturbou no seu “primeiro almoço de família”. Quem já passou por isso sabe bem do que estou falando...

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